(none) || (none)
Publicidade

Estado de Minas OPINIÃO

Quem paga a conta de quem nunca é convidada para jantar? 32q3m

A polêmica da declaração do ator Caio Castro e o valor altíssimo que mulheres que não cumprem padrões pagam pela falta de afeto ou mesmo um convite para jantar


29/07/2022 15:14

foto da colunista jessica balbino segurando uma taça
(foto: Arquivo pessoal)

Juro que eu tentei não entrar no tema e na polêmica, mas não consegui. Como acontece toda semana, a internet se juntou nesta para discutir quem é que paga a conta em jantares românticos: o homem? a mulher: os dois dividem? Isso aconteceu após uma declaração de do ator Caio Castro sobre pagar ou não o jantar e, por dias, a conversa seguiu, virando, inclusive meme, sobre este ser o possível tema da redação do Enem neste ano. 

Mas, piadas e risadas à parte, além desta ser uma questão absolutamente heteronormativa, afinal, e se o date for entre dois homens ou duas mulheres? E se for entre um trisal? Enfim, sinto uma preguiça imensa de como se pensa a sociedade apenas de uma forma patriarcal. 

Entretanto, o grande questionamento, pra mim, é o que fez a Tia Má no Twitter: “Quem paga a conta de quem nunca é convidada para jantar">


Quis não falar sobre, mas não consegui diante da provocação, senti essa necessidade e lembrei de um tuíte que fiz há alguns meses, lembrando que, quando estamos falando de uma mulher magra, nos aplicativos de paquera e também na vida offline, a mensagem que ela recebe é: vamos sair pra jantar? Quando estamos falando de mulheres gordas, sobretudo as racializadas, vale dizer, a mensagem é sempre: quero te arregaçar. 

E essa é uma regra, ainda que vez ou outra, apareçam algumas mulheres gordas para dizer: sou gorda e sempre fui muitíssimo bem tratada. Claro, sempre temos as ‘alecrim dourado’ no campo, né">


É um meme? provavelmente. Mas, me cansei de ver amigos compartilhando-o exaustivamente. Porque é engraçado? Pode ser. Mas é também engraçado rir do privilégio que se tem, enquanto há um grupo pra lá de oprimido e invisibilizado do outro lado. 

Mais do que isso: me irrita profundamente mulheres brancas e magras compartilhando o meme, se deliciando com ele ou com os convites para jantar negados e, ao mesmo tempo, fazendo propaganda do procedimento x, que reduz até y centímetros de barriga em n tempo, desde que não se come farináceos e/ou carboidratos. É preciso ar fome, caso se queira receber um convite para comer, é a mensagem que me chega. 

Além, claro, do deboche. O perfeito deboche, das mulheres muito magras, que, vestindo seu manto inabalável do feminismo - aquelas que só leem e ouvem mulheres, exceto, claro, se forem mulheres fora do padrão - dizem que é preciso olhar também para as mulheres muito magras que também nunca foram convidadas para o jantar, ou para as que ‘estão apenas 7kg acima do peso, mas, ainda sim, nunca mais foram convidadas para um rodízio de sushi’. 

Toda e qualquer tentativa de trazer pra si a questão e/ou de invisibilizar o problema cai no lugar da opressão e do silenciamento. Da falta de empatia. Daquele problema que não é nosso e, por isso, não merece nossa atenção. “Se não muda nada no meu dia a dia, dane-se”. 

É o mesmo lugar das mulheres que reclamam que ‘não aguentam mais receber flores no dia 8 de março’, em contraponto às que nunca ganharam uma flor fora desta data, que nunca receberam uma rosa que não fosse do chefe no Dia Internacional da Mulher. 

Urge que a gente desça do nosso banquinho de privilégios e olhe para o lado. Essa é uma conta altíssima que a mulher gorda vem pagando há muito tempo. E não pode falar sobre isso. Porque se falar, não tá considerando a mulher trans, a mulher preta, a mulher mãe, etc. Existe sempre uma pauta que está sobrepondo a da mulher gorda, que não encontra afeto nem dentro, nem fora dos movimentos. 

Que segue tendo que pagar o próprio jantar - e conta alheia, que não para de aumentar. 
*Para comentar, faça seu ou assine 3s2k3j

Publicidade

(none) || (none)